Onde ela tinha começado a parar de viver?

Ela acordou em um dia comum, meio sonolenta e derrubando alguns objetos que atravessaram o quarto sem olhar para os lados. No banheiro ela escova os dentes, começando pelo fundo e chegando ao sorriso, ficou nisso por um tempo talvez por preguiça ou covardia de enfrentar o mundo lá fora. Sem querer, enquanto ela enxaguava a boca, sentiu uns olhos que olhavam fixamente para ela, uns olhos que moram dentro do espelho, eles eram de um castanho sem fim, grandes e expressivos. E, repentinamente o seu olhar fez com que ela mesma ficasse tímida, sabe aquela sensação de um desconhecido nos olha fixamente? Essa era a triste conclusão: Ela já não se conhece mais.

No banho ela repara nas gotas que descem carinhosamente pela sua pele, passeando por toda extensão do seu corpo enquanto o seu pensamento queria saber o motivo pelo qual ela tinha se ignorado por tanto tempo, onde ela tinha começado a parar de viver? Por que ela abriu mão dos sonhos? Por que ela segue fazendo a economia mais burra que já existiu economizando a sua própria vida.

Notou os dedos das mãos enrugados pelas respostas que não apareciam, saiu do banheiro, deslizou a toalha pelo seu corpo acariciando todas as gotas que ficaram esperando esse cafuné, sentiu seu próprio corpo, pernas, quadris, ombros, seios e sorriu. Era mulher, não mulher de alguém, não mulher à espera de alguém, era mulher sua. Olhou para aqueles grandes olhos castanhos que moram no espelho, já não eram tão estranhos assim.

Amor à primeira vista, quem diria ela tão cética se apaixonou pelo reflexo que viu no espelho. Pegou sua bolsa, colocou nos ouvidos um bom samba de Noel e foi viver.

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