O Rei do Camarote e o Peter Pan

A internet foi inundada por uma onda de manifestações passionais contra a nova web celebridade Alexander de Almeida, autoentitulado empresário, que gravou um vídeo para a revista Veja SP deste último domingo. A sociedade adora malhar o Judas e Alexander, personagem fictício ou real, já chegou proposto ao apedrejamento. Sua figura desajeitada, fala robótica e gestual falso-espontâneo já rende piada pronta por si só, até os menos julgadores não conseguem resistir ao apelo da calvície envergonhada, a expressão pedinte ou o estilo de vida esbanjador.

Ele representa um tipo de aspiração velada da classe média brasileira de viver com privilégios no trânsito, nas filas e na vida. O camarote existencial é um tipo de aspiração do tipo de pessoa que não se acha insignificante o bastante, mas também não é notório o suficiente. Essa caricatura é a representação mais aproximada do que o escritor Dan Kiley classificou como “Síndrome de Peter Pan”. A figura lendária do jovem que morava na “Terra do Nunca” é bem apropriada para retratar o homem que se recusa a crescer e vive buscando aventuras pessoais baseadas em traquinagens irresponsáveis.

Aparentemente o status de empresário poderia poupá-lo da identidade do jovem encostado que não se segura no próprio bolso, mas existe uma nova gerações de Peter Pans que trabalham para pagar pela juventude emocional perpétua. Alexander revela, em sua excentricidade, um tipo de homem um pouco deslocado e entediado de si que busca sentido numa vida repleta de aparentes conquistas financeiras ou diversões libidinosas. Mas ele não procura mérito no esforço pelo trabalho e sua proeminência não surge do reconhecimento de suas realizações.

A bem querência que busca é aquela do sorriso fácil comprado com algum empréstimo de status – como ele mesmo diz. Esse tipo de Peter Pan sofre de incapacidade de formar vínculos profundos alegando que escolhe uma vida de solteiro. Seria uma escolha se a outra de estabelecer uma conexão duradoura fosse factível, mas não é. Regado de opção ele está fixado em nenhuma, sua escolha é uma não-escolha completamente paralisante. O que mais choca em Alexander, no entanto, não é a sobreposição de uma resistência em amadurecer e viver caçando admiradores, mas o quanto revela de todos nós.

Com os dedos nervosos postados sobre os celulares touch qualquer esboço de sorriso pode virar hit no Instagram. Numa cultura que acha normal que jovens que se sustentam e trabalham vivam para além dos 25 anos na casa dos pais como reizinhos poupadores não estranha que Alexander tenha sido alvo de indignação. Quando olhamos aquele olhar perdido, carente de atenção, likes e seguidores sentimos a denúncia de um tipo de infantilidade que nos persegue, aquela que não reconhece o valor de si mesma e mendiga aprovação. A raiva projetada sobre o playboy é de quem se percebe parecido buscando uma felicidade insaciável e sem destino. A indignação é uma proteção para não se ver no absurdo do espelho, pobre de afeto e soltando fogos sobre champagnes que não existem.

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