O que o longa “O quarto de Jack” nos ensina sobre liberdade

Existe aquela ideia previa sobre o que um diretor pode fazer a partir de um tema pesado; geralmente pesar um pouco mais. Dá pra imaginar a exploração desse peso, a conversão pras toneladas, o sensacionalismo oportuno. Em menor probabilidade, tudo pode ser mais leve, se é que um assunto desses pode sair ileso de sua dimensão trágica.

Muitos dizem que poupar o espectador dessa experiência de tensão estimulada é uma maneira de acovardar um produto de impacto, já eu, penso que no caso dessa história, atenuar as proporções, pode ser um proposta mais difícil e também nobre.

“O quarto de Jack” é um filme que consegue ser comovente por engolir o choro e avançar pelo otimismo, foca não na escuridão do quarto, mas naquela mínima chance, na claraboia – a luz que tem pra hoje. Graças a ela, penetramos naquele universo obscuro que lembra ao mesmo tempo algo parecido com lar. A ideia de lar confrontada com o tema “sequestro” traz um caldo relevante para pensarmos como se estabelece no ser humano a ideia de espaço, proteção e livre-arbítrio em situações tão tóxicas como essa para a lucidez.

Uma escolha narrativa que antecipa seu possível epilogo (encerramento) porque se propõe a examinar várias perspectivas sobre a ideia de liberdade. Em um dado momento o menino quer voltar ao quarto-cativeiro, mesmo já tendo entendido que o mundo é maior, muito maior do que aqueles 10 metros quadrados. E é interessante entender nosso senso de espaço manipulado pela câmera para que o espectador pense que aquele quarto era muito maior do que parecia. A noção do menino sobre aquele lugar de efeito hostil revela-se distorcida já que por muito tempo àquele era o ambiente onde cabia a sua organização cognitiva sobre o mundo, seu dispositivo de abstração era fundado no que a sua mãe contava ou ele via pela televisão.

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O grande mérito de uma história real adaptada para a ficção é encontrar um caminho dinâmico para explorar nuances. Esse extrativismo de detalhes pode ser visto em diversos momentos. A entrevista com a mãe parece um choque de realidade bastante cruel, mas ao mesmo tempo nos leva a uma reflexão polêmica a questão. Como mãe, o seu papel era mesmo ter mantido a criança junto dela durante o período de confinamento ou ela deveria ter aberto mão da criança e tê-la mandado a um lugar seguro para que a sua infância fosse preservada? Mas a pergunta que se sobrepõe é: quem poderia julgar o que ela deveria ter feito?

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Sair da sala após a projeção com uma sensação de que somos tão livres sem nos darmos conta, ou o quanto somos capazes de descobrir novos mundos quando a vida nos obriga ao improviso. Redescobertas preciosas, um efeito que pode não ser uma novidade, mas que nos acerta em cheio: a noção de que liberdade é uma descoberta diária e quase sempre uma decisão também.

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