O mito da mulher vulgar

“Vulgar: De procedência ruim; de natureza baixa; grosseiro, rude.” Quando empregado como adjetivo para uma mulher, vulgar é aquela despudorada, sem o comportamento requintado de uma dama e que exibe sua sexualidade.

Na infância, a mulher vulgar era algo completamente definido para mim: a mulher de roupas curtas, de batom vermelho, de gargalhadas altas, dada a um comportamento sensual e indiscreto. Era – embora eu ainda não compreendesse – a mulher livre. E é exatamente esta mulher que o moralismo sempre denominou vulgar: a mulher que não se apega às amarras que o pudor lhe impõe. O mito da mulher vulgar não é apenas proveniente da mais lastimável ignorância: é cruel. A vulgaridade – enquanto adjetivo pejorativo – é uma espécie de condenação social generalizada à mulher que se assume dona de si. À mulher que se nega ao pudor e à hipocrisia. Por isso mesmo, e não por acaso, é tão incomum ouvirmos falar em “homens vulgares”. Aos homens, damos o direito à promiscuidade, ao despudor, ao que é imoral. Para a mulher, isto é chulo, pobre, desprezível.

A mulher vulgar – esta inventada pelo moralismo velado – é aquela que tem medo de mostrar-se tal qual ela é. É quem não esconde os seus desejos, as suas propensões promíscuas – as quais, em maior ou menor proporção, todas têm. É o modo sutil que a sociedade encontrou de ditar-nos o comportamento, de conter-nos a liberdade, de – como sempre o fez – nos rotular. Vulgar é a amante, a Geni, a meretriz. Somos vulgares quando não camuflamos nossos desejos.

O mundo que quer a mulher meiga, correta e submissa costuma atribuir a vulgaridade à mulher livre. Hoje – talvez apenas um pouco mais madura que naquela velha infância – eu amo a vulgaridade. Eu amo o batom vermelho. Eu amo as bebidas fortes. Amo esse nosso direito de ser quem somos – e se isto nos torna vulgares, que o sejamos, então. Porque para quem compreende o sentido da liberdade e da igualdade, a liberdade é um mito. E, para mim, garanto: sempre o será.

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