Nos meus defeitos têm um pouco de pessoa

Vivo na ficção, todo dia sou um personagem diferente, uma loucura com nome e sobrenome. Faço coleção de defeitos. E, longe de mim, como muitos, dizer que ser “sincero demais” é meu maior, e tão sofrido, defeito. Eu tenho defeitos de verdade. Que sangram, choram, esperneiam, gritam, assustam pessoas e me fazem passar vergonha! Meus defeitos são monstros internos que, vezes me assustam, vezes se tornam melhores amigos.

Eu não tenho defeitos bonitos de dizer: perfeccionismo, sinceridade ao extremo, inocência e riso incontrolável em horas inoportunas. Meus defeitos são pessoais demais para serem tão cheios de bom-mocismo. Não confio em pessoas que se dizem cheias de paz e certezas em tempo integral; defeitos, medos, loucuras, são sempre uma dor bonita de se ler. Os meus defeitos assustam, quando não criam uma imagem estranha e caótica do que eu sou. Algo difícil de lidar, e pior, impossível de explicar. Mas, alguns, insistentes e sádicos como são, dizem que querem me conhecer por inteiro, não sei o que se passa na cabeça deles! Para eles, sugiro algo mais simples, sei lá, que tal ir conquistar a África, a Oceania e mais um continente a sua escolha?

Tenho um defeito muito peculiar e que poucos entenderiam. E não que eles precisem, mas sabe como é, somos inseguros e a aprovação alheia sempre nos cai bem. Volta e meia, quando estou contando uma história daquelas que até me levanto da mesa para contar, eu minto. É, mentira mesmo, daquelas torpes e sem motivos. Não que aconteça sempre, claro, mas já aconteceu algumas vezes, principalmente quando estou ansioso, seja de alegria ou insegurança. Se estou contando, gritando, em cima da mesa, cheio de ênfase, pulando, que os carros estavam a 220 km/h quando colidiram, na verdade, eles estavam, no máximo, a 180 km/h. Se encho a boca para dizer que o beijo dela era o melhor do mundo, na verdade, ele era só o melhor do bairro. Ou do quarteirão. No máximo. Quantas vezes já inventei histórias loucas em festas só pela simples diversão de não ser tão banal quanto realmente sou. De dono do Google a vendedor de miçanga. De pessoa que abomina praia a surfista nas horas vagas. Quantas vezes já menti que vi filmes que não vi somente – como se fosse coisa pouca… – para conquistar uma mulher que, até naquele instante, nem sabia o meu nome. Loucura ou charme de escritor? Depende dos olhos e corações que se dispõem a ver.

Eu, volta e meia, sinto inveja. E ainda tenho a cara de pau de escrever “volta e meia” só para parecer como se fosse um eventual acontecimento. Tenho inveja de quem viaja mais que eu, de quem vende mais livros que eu escrevendo frivolidades, de quem sorri e, só por sorrir, já trinca o abdômen. É engraçado observar como muitos se dizem invejados, mas poucos são os que assumem sentir inveja. Fico pensando, então, por onde será que andam os invejosos? Será que dizendo que se sentem ofendidos pela inveja alheia? Seria muito louco caso os invejosos fossem, em sua maioria, os que se passam por invejados. Seria muito louco, muito louco…

Quando amo então, coloco uma pitada de delírio em meus defeitos. Intensidade, insegurança, ansiedade, falta de paciência, imaturidade e um misto de conchinha e tapa na cara. Parece bonitinho, e, às vezes, até é. Admitir os nossos defeitos é árduo, constrangedor, e tudo de mais perverso que existe, caso não fosse a verdade. Se olhar no espelho e dizer: “É, esse sou eu” é algo amargo demais para descer suave pela garganta. Se expor é tão louco quanto libertador. Se expor é ter segurança e coragem para admitir a si o que você realmente é – mesmo que no fundo sempre omitamos alguma coisinha, a gente adora se enganar. Com o tempo a gente aprende a lidar, tem mais consciência do que somos, mudamos um pouco, cedemos em algo, contamos mais mentiras e, na sorte, encontramos alguém com algumas loucuras iguais as nossas. É meus caros, essa é a vida: um grande defeito que, vez ou outra, distribui suas qualidades em forma de amor, carinho, pôr do sol e doces.

Alguns desses defeitos trabalho com afinco para melhorar, outros deixo como característica pessoal, outros só ouço que tenho e faço cara de paisagem quando me contam. Mas o bom de ter vários defeitos é que aprendemos a ter um pouco mais de empatia com as loucuras, os medos e os defeitos dos outros. Menos, claro, com o – imperdoável – defeito de colocar ketchup na pizza. Esse nem os Deuses têm o poder de perdoar, nem os Deuses…

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