Ela disse sim, e morreram de inveja…

E ela, enfim, disse sim.

Quem diria? – dizem as más línguas. Logo ela, que dançava até o chão ou até que os faxineiros viessem varrer-lhe os pés, sempre calçados num sapatinho 35 sem salto, avisando que mais uma noite de samba tinha chegado ao fim. Logo ela, que cantava, encantava, tomava uns bons goles de cerveja, dava um sorriso sincero, fazia umas gracinhas e geralmente se despedia dizendo que hoje não, muito obrigada. Logo ela, que sempre teve uma quedinha por aproveitar a vida, que é tão curta quanto a mais comprida de suas saias. Logo ela, que sempre perdeu o celular, a carteira, o Bilhete Único, a hora e os campeonatos de cuspe à distância… É, parece que agora ela ganhou.

Mas quem será que é ele? – perguntam as más línguas. Quem será que é ele, que ela jura que existe, mas que a gente não vê nem a sombra? Quem será que é ele, que toma dela um pensamento cá, outro lá, uns goles daquela cervejinha sagrada e os beijos mais carinhosos que ela já distribuiu por aí? Quem será que é ele, que coloca ainda mais brilho naquele sorriso de 33 dentes e naqueles grandes olhos castanhos que sempre gostaram de pequenos olhos castanhos? Quem será que é ele, que a fez desencostar o velho violão da parede e arranhar um Alceu Valença, enfim dando sentido ao “tu vens, tu vens, eu já escuto os teus sinais”?

E o que será que ele fez pra ela? – especulam as más línguas. Será que foi promessa de casa, comida, roupa lavada e um milhão por mês? Será que foi amarração ou a mandinga da banana que ele aprendeu no programa do Eli Corrêa? Ou será que foi um sexozinho delícia com direito a muito suor, muita saliva e uma conchinha gostosa, daquelas em que os corpos se encaixam e não se precisa de mais nada para acordar sorrindo? Não sei. Só sei que quando eles dançam, a Terra dá uma trégua no movimento de translação, porque o espetáculo, apesar de simples, é bonito por demais. E quando eles descansam, então a Terra trata de girar, que é pra preparar um dia mais do que convidativo fora daquele quarto que, das seis da manhã às seis da tarde, lhes parece suficiente.

Dizem por aí que ela, valentona como é, ainda resiste a confessar que foi picada pelo mosquito da ternura – conta pra todo mundo que todas aquelas manchinhas avermelhadas foram obra dos borrachudos no último fim de semana de praia. E que todas aquelas risadas são obra de mais livros de anedotas que ela vem lendo. E que aquelas canções românticas cantaroladas meio que sem querer debaixo do chuveiro são mera casualidade. Mas ainda bem que, por mais que a gente tente impedir, o sentimento, quando é bonito, sempre cresce. E arranca as cascas, cicatriza as feridas, lava a alma. Bota uma dúzia de sorrisos no rosto por minuto, 300 ême-éle de chope sem colarinho no copo de vidro por noite e apetite pra bater um PF no capricho por almoço. Leva embora os nossos medos, as nossas mágoas, o batente da porta e o que mais estiver pela frente. E traz de volta a coragem de se arriscar. Porque sentir é para os fortes. Só para os fortes.

E pouco a pouco, o travesseiro dele vai ficando inundado do cheirinho dela. Os lençóis dela vão ficando salpicados de fios de cabelo que insistem em cair da cabeça dele – denotando talvez a possibilidade de uma calvície precoce. O colchão dele vai se moldando no formato ideal para abraçá-la quando ela voltar. Coisa de cama, coisa de calma, coisa de alma, coisa de coração. Fiquei até sabendo que ela já deixou uma escova de dentes no potinho do banheiro dele. E que ele, vez ou outra, já se esqueceu de conferir o placar do futebol enquanto estava com ela.

E se acaso ela chegar perguntando como é que todo mundo ficou sabendo que ela está apaixonada, diz que foi o passarinho verde e aquela mania HORRÍVEL que ele tem de sair fazendo fofoca da vida de gente de bem.

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