As lições empíricas do amor

Ninguém nasce sabendo andar. Dizem que eu, sempre boa entusiasta da mansidão da vida, demorei pelo menos uns quinze meses para começar a cogitar a possiblidade de levantar minha bela bunda cheia de talco e Hipoglós dos aconchegantes colos que me embalavam tão maternalmente. Quando levantei, é claro que não foi lá essas coisas: faltava coordenação, faltava atenção, faltava concentração, faltava disposição. As pernas curtinhas não se entendiam muito bem. Não se movimentavam no mesmo ritmo. Acabavam, hora ou outra, sempre dando um jeito de derrubar aquele belo bebê bobo no chão. E quantos tombos. E quantos choros. E quantos risos. E quantos roxos.

Muitas quedas mais tarde, finalmente comecei a ensaiar passos mais ajustados, sincronizados, alinhados, bem treinados. Vez ou outra, a euforia e autoconfiança infantis obviamente ocasionavam alguns pequenos tropeços esbaforidos e às vezes até grandes e constrangedoras quedas disfarçadas pelos sorrisos de quem já não tem mais idade para cair. A verdade é que até hoje eu caio de vez em quando. Aprendi a rir das minhas quedas, mas é natural que algumas ainda causem dor. O importante é que agora eu ando. Corro se quiser. Pulo se quiser. Pulo numa perna só se quiser. Planto bananeira se quiser. Encosto o pé na cabeça, acredite se quiser.

E aprendi que com o amor também é assim. Aprendi empiricamente, usando aquele mesmíssimo método de quedas com o qual entendi as penosas lições do andar. Aprendi que como em quase tudo na vida, no amor, é a prática que leva à perfeição. Ou à imperfeição, já que é ela quem traz tamanha graciosidade a essa energia linda que chamamos de amor. Aprendi que não adianta você tentar amar certinho logo de cara. Tem que amar errado mesmo. Assim meio desajeitado. Assim desconcertado. É amando desse jeito esquisito que aos poucos você vai aprumando o passo. E o laço. E o compasso. E o abraço.

Dizem por aí que ninguém aprende nada com os erros alheios. E nesse caso isso tem peso dois, Meu Amor. Cada um tem seu jeito de amar. Por mais que você ouça os conselhos mais bem intencionados, leia as mais românticas histórias já inventadas, consuma todo o conteúdo desses blogs apaixonado ou ouça música sertaneja no último volume com um pote de sorvete nos braços , nada adianta se você não treinar. Entende de uma vez por todas: é amando que se aprende a amar.

Sempre tive raiva de gente mesquinha. Gente que economiza amor, então. Por estes guardo imenso rancor. Gente que diz que tem medo. Que ela(e) não merece. Que não vale a pena. Que não é a pessoa certa. Entende, Amado: não precisa ser. Treino é treino, jogo é jogo. Ama. Nem que seja só um aquecimento. Só uma pelada de final de semana. Só um gol a gol de quinze minutinhos. Mas ama. Quem ama mais, ama melhor. E você nem imagina como são felizes os bons amantes.

Não se torne menos amável após um desamor. O mundo precisa de gente disposta a amar. Compreende que amores passados são treino para os amores que estão por vir. Ria deles. Percebe que o amor não é bem finito. Você não precisa poupar. Ele se reproduz mais do que os lactobacilos vivos daquele iogurte estranho que você graciosamente insiste em tomar.

Então ama. Ama porque sempre vale a pena. Chama de amor mesmo. É curtinho. É bonito. É sonoro. Não precisa dar rótulo, nome, sobrenome, registrar nem reconhecer firma. Só ama. Uma hora, depois de tanto treinar, do mesmo jeito que você aprendeu a andar, vai aparecer aquela outra perna disposta a te acompanhar que caminha no mesmíssimo ritmo que a sua. Vocês vão cair, vão tropeçar, vão levantar. Vão se coordenar, vão se organizar, vão caminhar. Vocês vão se amar.

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